Eu sei, me lembro bem desse dia!
Eu era pequena e minha mãe me deu um beijo dizendo que era pra eu me comportar. Fez o mesmo com meu irmão.
Era de manhã, não muito cedo... As panelas já estavam no fogo pra fazer o nosso almoço.
Fiquei na janela dando tchau pra minha mãe até a hora dela sumir das minhas vistas.
Meu irmão fazia o mesmo.
Corremos e nos jogamos num sofá cama verde escuro pra assistir nosso desenho.
Ouvimos um barulho estrondoso vindo lá da rua.
Corri pra janela e comecei a achar estranha tanta movimentação.
Algumas pessoas diziam que uma mulher havia sido atropelada...
"Um maluco num carro branco passou voando e a mulher voou pelos ares!! Tá lá estendida no chão! Já chamaram o corpo de bombeiros?!" - gritava um dos vizinhos.
Olhei pra ela e chorando, perguntei se era a minha mãe que tinha sido atropelada.
Ela me disse que não, que minha mãe já tinha entrado no ônibus pra ir pro trabalho...
Mandou eu me acalmar e ir lavar o rosto.
Eu não fui.
Entre um soluço e uma lágrima, eu continuava insistindo que era a minha mãe sim.
Ela então segurou forte na minha mão e disse: "Acredita em mim, minha filha! Agora anda, vai logo lavar esse rosto... Você tá assustando seu irmão!"
Eu fui...
Quando voltei pra sala, eu a vi na janela comentando com um vizinho que a neta dela havia acabado de sair de lá pra ir pro trabalho.
Eu fiquei parada, quase que atrás dela... Eu não me mexia. Precisava saber o que o vizinho iria falar.
"Não, dona Nonô! Não foi a Nubia não. Essa mulher já é uma senhorinha!"
"Ah bom!" - respondeu ela.
Quando ela se virou me viu parada ali, bem atrás dela!
Me levou até o sofá cama verde escuro e me colocou sentada nele. Passou a mão pela minha cabeça e disse: "Vamos ligar pro trabalho da sua mãe? Você quer falar com ela?!"
Balancei a cabeça positivamente e ela o fez.
Me acalmei...
Ela me perguntou se eu queria comer um ovinho frito com a geminha mole... E eu perguntei se tinha pão!
Ela me disse: "Mas é claro que tem pão! Você quer que eu corte pedacinhos pra você molhar na gema do ovo?!"
Ela sabia que eu queria. Foi ela quem me ensinou a gostar de comer ovo frito dessa maneira!!
Era uma tentativa de me deixar feliz - hoje eu sei!
Logo depois de almoçarmos o ônibus da escola chegou para nos buscar.
Ela nos levou até a porta do ônibus e disse: "Não espatem se ela chorar. Uma mulher foi atropelada aqui perto e ela achou que era a mãe. Tá muito abalada!"
A porta se fechou e o ônibus começou a andar.
E ela ficou lá da calçada, bonitinha, dando tchau pra gente.
Viveu 99 anos plenos.
Era lúcida e fazia a prova dos 9 como ninguém.
Teve 2 filhos, 4 netos, 7 bisnetos e 1 tataraneto.
Ontem ela se foi.
Beijos da, pra sempre, Garota Marota.
sábado, 17 de julho de 2010
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